O Ministério das Cidades pode se ver obrigado a suspender temporariamente a seleção de propostas para a construção de 30 mil novas residências através do programa Minha Casa, Minha Vida. Essa medida drástica surge em meio a um cenário de cortes profundos no Orçamento de 2024, que resultaram no congelamento de despesas em diversas áreas.
As unidades habitacionais em questão seriam destinadas a municípios com população de até 50 mil habitantes, atendendo às famílias enquadradas na faixa 1 do programa habitacional – aquelas com renda bruta mensal de até R$ 2.640.
Alerta emitido ao Planejamento e Planalto
Em um ofício enviado ao Ministério do Planejamento e Orçamento na última terça-feira (6), o Ministério das Cidades alertou sobre o impasse orçamentário e a possível necessidade de suspender o processo seletivo em andamento. Interlocutores do Palácio do Planalto também foram notificados sobre a situação.
A pasta, comandada pelo ministro Jader Filho (MDB-PA), ressaltou que o elevado número de propostas recebidas – 7.121 no total, somando mais de 200 mil unidades habitacionais – é um indicativo da “demanda represada em todo o país” por moradias populares. Contudo, o bloqueio orçamentário imposto pode inviabilizar a continuidade do processo seletivo.
Impacto sobre os municípios menores
A suspensão da seleção de novas moradias do Minha Casa, Minha Vida para os municípios de menor porte tem potencial para gerar atritos com o Congresso Nacional. Isso porque a construção de unidades habitacionais nessas localidades é considerada uma prioridade pelos parlamentares, que buscam atender às necessidades de suas bases eleitorais.
Os empreendimentos habitacionais destinados a essas áreas são de pequeno porte, compreendendo entre 25 e 50 unidades cada. As prefeituras locais são responsáveis por elaborar os projetos, contratar as construtoras e selecionar as famílias beneficiárias.
Recursos do FNHIS e o impasse orçamentário
O cerne do problema reside no fato de que, durante a votação do Orçamento no Congresso, os parlamentares alteraram a classificação do resultado primário das obras financiadas com recursos do FNHIS (Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social).
Enquanto as obras custeadas pelo FAR (Fundo de Arrendamento Residencial) estão incluídas no PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), as unidades erguidas com dinheiro do FNHIS nos municípios menores foram classificadas, do ponto de vista orçamentário, como despesas discricionárias comuns, fora do escopo do programa de investimentos.
Essa reclassificação tornou esses recursos mais vulneráveis ao congelamento orçamentário imposto pela equipe econômica do governo, que buscou conter as despesas em meio ao aumento de gastos obrigatórios e à frustração nas receitas previstas.
Impacto do congelamento sobre o Ministério das Cidades
O Ministério das Cidades sofreu um congelamento total de R$ 2,1 bilhões em seu orçamento. Desse montante, R$ 1,1 bilhão incidiram sobre verbas do PAC, representando cerca de 30% do total disponível para o programa. Outros R$ 849,6 milhões recaíram sobre as despesas discricionárias, englobando custeio e outros investimentos, o que equivale a 60% do valor disponível para essas despesas.
A verba reservada especificamente para iniciar a contratação das 30 mil unidades do Minha Casa, Minha Vida nos pequenos municípios era de R$ 627,6 milhões. Com base nas projeções do Ministério, será preciso bloquear todo esse financiamento, impedindo a continuidade do processo de seleção.
Pedido de revisão e possível cancelamento
Diante desse cenário, o Ministério das Cidades solicitou ao Planejamento a revisão do bloqueio orçamentário, especialmente no que se refere à verba destinada ao programa habitacional. Caso essa revisão não seja concedida, interlocutores afirmaram que a seleção de propostas pode ser cancelada definitivamente.
O planejamento inicial estabelecia a escolha dos projetos em agosto, a contratação em outubro e a liberação dos recursos até o final deste ano. O objetivo dessa agenda era assegurar o engajamento das prefeituras nas obras, que terão um custo total de R$ 3,9 bilhões ao longo de um período de cinco anos.
No entanto, sem os recursos disponíveis, o governo terá de adiar as fases de contratação e repasse, o que representa um risco elevado em ano de eleições municipais. A preocupação é que os novos gestores eleitos possam não ter interesse em dar continuidade aos projetos apresentados, desperdiçando tempo e esforços investidos no processo seletivo.
Público-alvo e modalidades do programa
A escolha de residências pelo FNHIS é voltada principalmente para famílias enquadradas na faixa 1 do programa Minha Casa, Minha Vida, com renda total mensal de até R$ 2.640. No entanto, em casos de emergência ou calamidade pública, famílias da faixa 2 (renda de até R$ 4.400) também podem acessar essa modalidade.
O plano inicial do governo era selecionar propostas para a construção de 5.000 unidades habitacionais destinadas à população que vive em áreas de risco de desastres, locais insalubres, impróprios para moradia e assentamentos precários. Outras 25 mil unidades seriam distribuídas entre estados e o Distrito Federal, considerando fatores como o déficit habitacional da população com renda bruta familiar de até 1,5 salário mínimo.
A portaria que regulamenta a seleção prevê repasses de até R$ 130 mil por unidade habitacional produzida ou adquirida.
Impacto sobre o déficit habitacional
A possível suspensão ou cancelamento da seleção de propostas para a construção de novas moradias populares representa um revés para os esforços do governo federal em reduzir o déficit habitacional no país. Esse déficit atinge principalmente as famílias de baixa renda, que enfrentam dificuldades para acessar moradias dignas e adequadas.
Ao interromper o processo seletivo, o governo corre o risco de perpetuar a carência de habitações acessíveis, especialmente nos municípios menores, onde a demanda por esse tipo de solução habitacional é significativa.
Desafios e Alternativas para Habitação Popular
A crise orçamentária que ameaça a construção de 30 mil novas moradias do Minha Casa, Minha Vida evidencia os desafios enfrentados pelo governo federal na promoção de políticas habitacionais efetivas. Embora a situação seja complexa, é fundamental que o governo busque alternativas viáveis, priorizando o atendimento às necessidades das famílias de baixa renda e promovendo o desenvolvimento sustentável das cidades.
Somente por meio de um compromisso genuíno com a habitação popular, aliado a uma gestão responsável dos recursos públicos e a um diálogo constante com a sociedade, será possível superar esse impasse e garantir que o direito à moradia digna seja uma realidade para todos os brasileiros.